28.7.09

NOVAS MEMÓRIAS ANTIGAS Nestes tempos de repouso total, a única coisa que tem poder e direito de agitar-se é o pensamento e, consequentemente, a memória. Eles, se já não paravam quando o corpo se agitava, agora estão mais rápidos, lépidos e soltos. Outro dia minha companheira chegou me dando um ultimato: “trata de sarar logo, minha irmão consegui quatro convites para a inauguração da festa de N. S. Achiropitta na barraca principal e, eu quero ir com você!”. Imaginem meu desespero só de pensar que a oportunidade única poderia ser desperdiçada. Com os pensamentos absortos na festa a memória tomou conta do espaço e voltei, de pronto, ao passado quando ainda na minha juventude, o ponto de parida para qualquer “programa” nas noites do fim de semana era a quermesse da Igreja. Lembrei, inclusive, da festa que era realizada antes da inauguração da quermesse, a Procissão de N. S. da Achiropitta. Era algo de maravilhoso. Meus se fecharam e as imaginas voltaram como por encanto. Comecei a visualizar a saída da Procissão, o povo formando alas para acompanhar a imagem da padroeira do bairro que saia em um andor maravilhosamente ornado com flores e muitas cores para uma peregrinação pelas ruas do meu Bixiga. O povo do bairro em perfeita miscigenação ítalo-afro-baziliana, com alguns pitacos lusitanos e outros das várias etnias que haviam adotado o bairro como sua pátria, se não ia para as calçadas engrossar as alas da procissão, ficava em casa, assistindo das janelas e dos balões de suas residências a passagem do cortejo. Para alegrar a Santa, no para-peito das janelas e nas grades dos balcões e varandas, eram estendidas colchas, mantas e toalhas multicoloridas, de vários motivos e acesas velas votivas. Por deferimento e também por interesse pecuniário (sobrevivência da paróquia), o vigário promovia a parada do andor na frente das casas das famílias mais abastadas que, prestigiadas não mediam esforços e depois das preces e homenagens à Santa, faziam generosos donativos. Donativo aceito, o cortejo continuava em busca de outras famílias e, lógico, de outros donativos até qu8e o circuito se completasse e a Santa voltasse à sua Paróquia. Finda a procissão, era promovida a cerimônia final com uma Reza muito concorrida pelos fiéis. Depois da cerimônia religiosa, o vigário fazia uma pequena preleção agradecendo a todos pelo sucesso da homenagem e convidava o povo a se dirigir à quermesse e se divertir com respeito e consciência. Aí a festa tinha início. Antigamente as barraquinhas eram montadas nas calçadas da Rua 13 de Maio no quarteirão compreendido entre as Ruas São Vicente e Conselheiro Carrão. Eram barracas de roleta, pescaria, bolo nas latas, e outras que tais, distribuindo prendas. A maioria das prendas havia sido coletada em doações dos próprios fieis que, na festa endoideciam para ganhar uma delas. Havia a barraca do Leilão onde pratos de iguaria, litros de bebidas mais sofisticadas eram leiloados e chegavam a ser arrematados por valores significativos. Hoje a quermesse se transformou. Ganhou infra-estrutura, embora ainda ocupe um espaço da Rua 13 de Maio, já tem espaço próprio onde as “mammas” fazem suas massas, suas porpetas, suas bracciolas e servem ao populacho que se empanturra com tais delicias. Para falar com franqueza, não sei se gosto mais da antiga quermesse ou da festa atual. Sei apenas que sábado próximo irei usufruir do convite que foi conseguido por minha cunhada e voltarão Bixiga depois do susto que tomei. Aiiiii como eu sofro!!!!!!

23.7.09

OUTRAS
MEMORIAS
PIREPAQUIANAS
Quando somos abruptamente assaltados por um mal súbito e vai parar internado em um nosocômio, tive a certeza ao vivo e a cores recentemente, o amor próprio, a vergonha, a pudicícia vão para o vinagre.
Você, ao retomar a consciência em cima de uma cama hospitalar, verá que todos os valores alimentados por anos, ficaram totalmente invalidados.
Eu acordei na manhã do dia 19 pp, sem minhas roupas, trajando apenas um camisolão que, apesar de poder ser fechado na parte traseira, fora mantido aberto. Lembrei-me do ocorrido na tarde do dia anterior e justifiquei meu estado em virtude da incontinência urinaria de que fui acometido enquanto aguardava os cuidados médicos sentado em um banco incomodo do PS.
Naquele inusitado uniforme fui mantido por uma semana inteirinha. Banhos eu tomava, inicialmente, na própria cama, dados por uma das enfermeiras. Aqui devo abrir um parêntese para homenagear os “anjos hospitalares”, as enfermeiras. Elas cuidam de você com o mesmo carinho e afeto que uma mãe cuida de seus filhos.
Foram elas as causadoras da minha perda da vergonha, da queda do meu amor próprio quando me despiram e me banharam e quando me trocavam as fraldas geriátricas.
Faziam tudo com tanta naturalidade que depois da surpresa do primeiro dia, passei a aceitar os procedimentos com naturalidade.
Quem, como eu, fica internado na enfermaria de um hospital publico, rodeado por mais sete outros internados, não pode se queixar da falta distração. Os companheiros de infortúnio, por si só, podem ser motivo de muitas risadas.
Eu, por exemplo, quando me dei conta da situação, percebi que estava rodeado por pessoas bastante interessantes. Nas camas da frente estavam quatro doentes, contando-os da minha esquerda para a direita, tínhamos um com uma figura bastante acaipirada (não quero dizer boba), fala mansa, modos calmos, mas de grande perspicácia. Em virtude do diabetes, estava cego de uma vista e a caminho de perder a outra. Resignado com sua situação, estava chateado por ter sido apartado de sua família e da criação (criava galinhas) sem ter uma só réstia de esperança para a cura.
Na minha frente, um senhorzinho de cabeça encarquilhada, que depois fiquei sabendo ser violeiro e animador de quermesses e rodeios. Mesmo com a glicemia em alta, era um faminto contumaz, devorava tudo que lhe era servido e, ainda não satisfeito, percorria as bandejas dos demais companheiros de quarto para recolher pães e frutas dispensadas, guardando-as para as horas de intervalo entre as refeições.
Os dois outros internados à minha frente, eram pacientes renais que eram submetidos, todas as notes a sessões de diálise. Dormiam muito durante o dia.
Depois que o caipirão e o violeiro tiveram alta, quase na freta final de minha estadia, foram internados um rapaz negro de muita solicitude, que ali estava para exames pós-cirurgia de extração de um carcinoma bem sucedida nove anos atrás e que agora, parece, tentava retornar.
Outro que foi internado em nosso mundinho foi um senhor que ali estava para avaliação de uma operação cardíaca que, parece, estava querendo descambar. Este senhor, já no primeiro dia, logo na chegada, devidamente acompanhado por sua esposa, ao desfazer a mala, retirou dela um par de chinelos um tanto espalhafatosos na cor verde, olhou frontalmente para mulher e disse: você está querendo que eu use esses chinelos? Se eu sair com eles aqui no corredor, vou ser cantado por médicos, enfermeiros e todos os pacientes. Tô fora!”
Assim, olhando e tentando analisar meus companheiros, os dias passavam mais rápidos e eu me distraia.
Os companheiros deitados do meu lado deverão ser descritos com outras memórias.

17.7.09

MEMORIAS PIREPAQUEANAS
Juro por tudo quanto é sagrado que nunca pensei um dia estar escrevendo memórias deste naipe. A gente, com o passar dos anos, se acha imune a qualquer tipo de ocorrência maléfica da saúde. Consideramos-nos verdadeiros predestinados à vida eterna. De repente, não mais que de repente, o inevitável acontece. Então percebemos o quão frágil somos perante os desígnios do destino. Hoje eu sei que é assim. Dia 18 de junho PP, uma quinta-feira sem maiores predicados a não ser da maravilha de ser véspera de sexta-feira o final de mais uma semana. Estava eu na empresa a quem presto trabalhos profissionais. Do nada comecei a sentir tremores de frio. Pensando estar em estado gripal, aguardei para ver se uma melhora acontecia. Nada, os tremores e o mal estar continuavam. Resolvi, então, contra minha vontade, ir embora para, já em casa, medicar-me melhor e me restabelecer. Comuniquei aos demais a minha decisão e sai. O trajeto entre a empresa e a estação do trem em Ferraz de Vasconcelos é pequeno, mas, não me animei em percorrê-lo como das outras vezes, solicitei que um taxi viesse me buscar. No trajeto dos trens até a Estação da Luz pareceu que eu já havia me recuperado um pouco. Desci do trem, dei uns dois passos e por uma fração de segundos o mundo saiu de baixo dos meus pés. Cai sentado. Recobrei minha consciência e me vi amparado por seguranças da CPTM que assistindo meu tombo concluíram que eu não estava em condições físicas ideais, ma ajudaram a sentar numa cadeira de rodas e me informaram que estavam me levando para o PS da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo e assim o fizeram. Ainda meio desnorteado me vi entrando no OS, respondendo perguntas aos enfermeiros e médicos que vieram em meu socorro. Meu celular estava no bolso e usei-o para chamar minha companheira e avisá-la do ocorrido depois, bem depois não me lembro de mais nada. Só me lembro do desespero da Sonia quando entrou no OS e me localizou. Eu estava em condições nada agradáveis, principalmente para ela que sempre me havia visto ereto, forte, alegre. Ali naquele banco do PS eu estava largado, abatido e todo urinado. O adiantado da hora, já havia sem passado umas quatro horas da ocorrência, e o meu estado não permitiu que ela tivesse qualquer duvida e, imediatamente, chamou meu filho que, por sua vez, convocou as três irmãs e foram ao nosso encontro. Minha filha Rossana é instrumentadora médica e graças a isso reconheceu depois de algum tempo um médico que ela tinha conhecido por conta de seu trabalho profissional. Aí, então, as portas puderam ser abertas e eu fui internado para averiguação. Na averiguação que, diga-se de passagem, foi de excelente qualidade já foi confirmado que eu havia sofrido um AVC de pequenas proporções, no cerebelo. Sequelas não foram constatadas, mas eu precisava ficar internado em observação. A Santa Casa de Misericórdia da São Paulo é uma instituição escola e o corpo médico de estudantes e professores é de excelente qualidade e a equipe que recebeu meu caso era composta de profissionais dedicados e de alta capacidade. Quando o mal se instala, podem crer, não se instala sozinho. No meu caso, alem do problema do AVC eu fui atacado por uma infecção bacteriana na perna esquerda que deu muito mais trabalho e sofrimento do que o próprio AVC. Minha perna ficou inteiramente coberta de bolhas que depois da minha alta hospitalar vieram a estourar e se transformaram em pústulas enormes prejudicadas, ainda, pelo meu diabetes. Hoje, passados quase 30 dias do ocorrido, ainda me mantenho sob repouso total buscando a cicatrização total das feridas originadas do ataque bacteriano e, para não me fazer esquecer o susto, tenho uma enorme e constante dor na bunda, principalmente na banda da direita, resquício da queda provocada pelo AVC e que espero, depois de curado dos outros males, uma fisioterapia poderá resolver. Outras memórias deste piripaque serão relatadas nos próximos dias, essas, porém mais engraçadas. Aguardem!