25.2.11

MEMORIAS DE BOTEQUIM II

Não tenho muito com que me ocupar no decorrer dos dias, então só me resta, como recurso extremo, lembrar de meu passado.
Faço isso com denotada alegria, mesmo porque, tal atividade pode me afastar do terrível alemão que ronda pessoas da minha idade, o grande facínora “Alzheimer”.
Pois muito bem, percebi que o meu texto sobre botequins teve plena aceitação entre os meus fãs, resolvi, então, fazer mais uma incursão ao passado e buscar outros botequins de meu real agrado.
Confesso, eram muitos, se fosse levar a cabo o registro de minhas Memórias de Botequim muitas e muitas linhas teriam de ser digitadas e editadas.
Por exemplo, tinha um botequim em Pinheiros, bem pertinho da Igreja de Pinheiros (Nossa Senorado Monte Serrat), onde eu cometia um enorme pecado ao longo de vários domingos do ano. Eu morava no Jaguaré e acompanhado da mulher e filhos, saia mais cedo para o almoço dominical e fazia a primeira parada nesse bar, a Igreja tão próxima nem tinha o prazer de nossa visita.
Era uma casa de dimensões tão diminutas que a freguesia que não tivesse chegado cedo, ficava aboletada nas calçadas e fazia seus pedidos aos gritos. Lógico, todos eram atendidos, assim, enquanto segurávamos os copos com uma das mãos, outra devorava as porções de tira-gostos (queijo provolone, linguiça calabresa seca, ricota seca apimentada, berinjela ao forno, sardela, aliccella, pão italiano).
A habilidade dos balconistas em preparar as batidas e caipirinhas era impressionante, a variedade de bebidas adicionadas a cada drinque era segredo de estado, não transmitida a ninguém. E nós, pouco interessados em segredos, queríamos, apenas, degustar daqueles acepipes e néctares sem culpa na consciência.
Outra lembrança de botequim me ocorreu agora e, para não perder a oportunidade passo a relatá-la.
O Antonio Capezzutto, um dos Duques de Piu-Piu, era funcionário antigo da Fábrica de Cigarros Sudam, instalada na baixada do Glicério, em nossa Sampa.
A nossa solidariedade era tanta que eu, trabalhando no 5060 da Avenida Celso Garcia (Penha) e o Antonio Settani trabalhando na Pontal, estabelecida na Avenida do Estado, altura do Cambuci, diariamente íamos encontrar o Capezzutto na saída do trabalho para, juntos, vencermos as íngremes subidas do caminho até o nosso querido Bixiga.
Porém, de quando em vez, sedentos de um dia repleto de lutas e labutas, resolvíamos, antes de encetar nossa caminhada, visitarmos um botequim instalado na Rua Helena Zerrener, bem próximo da Sudam.
Ali, matávamos nossa sede com algumas doses de batidas de coco, de amendoim ou, então, de caipirinhas e para acompanhar essas delícias, pedíamos algumas porções de “Joana D’Arc”, essa delícia era preparada da seguinte forma: alguns gomos de linguiça calabresa fresca, acomodados em um recipiente e cobertas com álcool. Depois de acomodadas, um fósforo era riscado e o fogo ateado. As linguiças assavam ao fogo de álcool e depois eram servidas, tendo como acompanhamento, fatias de pãezinhos (no sul, cacetinhos).
Depois de abastecidos, iniciávamos a caminhada para o lar, vencendo as subidas da Rua dos Estudantes, Rua Antonio de Lima, Rua São Paulo, Rua Américo de Campos, Avenida da Liberdade, Rua Condessa de São Joaquim, Avenida Brigadeiro Luiz Antonio, onde o trio se dissipava; eu ia para a Rua Major Diogo, o Capezzutto para a Rua 13 de Maio e o Settani para a Rua Santo Antonio.
Tempo bom, que não volta mais...